Introdução
No capítulo 4 mencionei que o Senhor pode ser chamado de o “Deus das eleições soberanas”, pois elas não se baseiam nas supostas qualidades que possa ter a pessoa a quem Ele chama para fazer a sua obra. Isso, muitas vezes, traz um problema sério a ser discutido, pois deixa evidente que o Eterno escolhe a uns e rejeita a outros, quer admitamos isso quer não (Rm 9.10-21). Outro fato curioso, e que se percebe claramente em nosso meio, é que se prega a salvação do ponto de vista teológico arminiano; não obstante, quando se fala em chamada ministerial, desde a Bíblia até os nossos dias, é possível ver claramente uma perspectiva teológica “calvinista”, ou seja, não há possibilidade de o escolhido decidir — ele nasce “predestinado” a ser aquilo e ponto final (veja apenas dois exemplos: Jr 1.5 e At 9.15 e cf. 2 Sm 12.24).[1] Assim, se fôssemos pensar como os não-cristãos, seria até possível dizer que “por ironia do destino” o sucessor do trono de Davi era um dos seus filhos mais novos e tinha como pais, um casal adúltero (2 Sm 12.24). Convenhamos, para os nossos “padrões, critérios e requisitos”, não é um “bom histórico” ou “antecedente” para alguém que vai liderar o povo de Deus. No entanto, o Senhor assim o escolheu, antes de nascer (2 Sm 7.12-17). O autor do segundo livro que traz o nome de Samuel registra: “Depois Davi consolou sua mulher Bate-Seba e deitou-se com ela, e ela teve um menino, a quem Davi deu o nome de Salomão. O Senhor o amou e enviou o profeta Natã com uma mensagem a Davi. E Natã deu ao menino o nome de Jedidias” (2 Sm 12.24,25 – NVI). Como a versão utilizada foi a NVI, os editores inseriram uma nota de rodapé para traduzir o nome dado pelo profeta ao sucessor de Davi: “Jedidias significa amado do Senhor”.[2] É fato curioso, para dizer o mínimo, que Deus tenha punido tão severamente o casal, tirando-lhes o filho do adultério (2 Sm 12.13-23), mas compensa-os, logo em seguida, dando-lhes outro, que será o sucessor de Davi (2 Sm 12.24,25 cf. 1 Cr 22.9,10). E isso baseado em quê? Claro que alguém alegará a onisciência e presciência de Deus, dizendo que todas as suas eleições se baseiam nas ações futuras da pessoa escolhida, as quais já são do conhecimento do Eterno. Não há dúvida de que isto é uma verdade, e fácil de entendermos, pois enquanto Abraão não sabia o que o esperava (Hb 11.8), nós vemos o quadro do plano divino em sua totalidade, com todos os seus contornos, pois temos as narrativas escriturísticas que são verdadeiros mapas, indicando o ponto em que cada um chegaria. Tais acontecimentos demonstram, felizmente, que na economia divina não existe acaso, e sim planejamento. Apesar de reconhecer o valor do reinado salomônico, esse texto se desenvolverá em outra perspectiva, visto que o autor redireciona (a partir do capítulo 7 do segundo livro que traz o nome de Samuel) a própria discussão fazendo com que a tônica se baseie totalmente na Aliança Davídica:
Os êxitos de Davi como rei são apresentados em 2 Samuel 5―9. Entre eles, estão as suas conquistas e a instituição de Jerusalém como nova capital. Isso foi completado com a chegada da arca da aliança trazida do exílio e restaurada à função original. Não é coincidência que esses fatos tenham sido seguidos pela aliança davídica, representante da constituição para a nova era. Assim, no capítulo 6 Davi restabeleceu o trono de Javé (i.e., a arca) e, no 7, Javé estabeleceu o trono de Davi.A aliança davídica era o cerne do propósito do narrador. Tudo na narrativa até esse ponto caminhava nessa direção. De agora em diante, tudo passa a ser compreendido à luz da aliança.[3]
Assim, não é a questão política e a sucessão imediata de Davi que formam o núcleo desse último texto, com o qual encerro a minha participação neste trabalho.[4] Minha atenção estará voltada totalmente para a escatologia judaica da qual a Aliança Davídica é um dos principais pilares. Se para a Igreja o arrebatamento marca o apogeu escatológico, para Israel, o cumprimento final da Aliança Davídica é o clímax, pois
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